Por 340 votos a 72, com uma abstenção, o plenário da Câmara aprovou há pouco o decreto presidencial que, em vigência desde sexta-feira (16), pôs em vigência a intervenção federal no Rio de Janeiro, transferindo do governo do estado para as Forças Armadas a gestão da segurança pública. Depois de mais de sete horas de debates e duelos regimentais, o relatório aprovado, elaborado pela deputada Laura Carneiro (MDB-RJ), segue agora para votação no Senado já nesta terça-feira (20), pautado como primeiro item do dia.
O decreto só terá validade confirmada caso os senadores confirmem a aprovação dos deputados. Só então as tropas militares, já a postos no Rio de Janeiro, podem de fato entrar em ação sob o general Walter Braga Netto, chefe do Comando Militar do Leste. Em caso de rejeição pelos senadores, suspende-se – e, quando possível, reverte-se – os efeitos da medida, procedendo-se em ato contínuo o devido comunicado de recusa à Presidência da República, hipótese pouco provável.
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Em pouco mais de meia hora de leitura, Laura Carneiro não só encaminhou a aprovação da matéria, mas também sugeriu ao governo, como ontem (domingo, 18) disse a este site que o faria, uma previsão orçamentária para a execução das ações militares no combate ao crime organizado. Para a deputada, que diz descartar hipótese de golpe militar, a intervenção tem que assegurar o rigoroso respeito ao estado democrático de direito.
Ainda segundo a parlamentar fluminense, a medida extrema, “remédio amargo necessário”, impunha-se devido ao recrudescimento da violência e do crescimento do crime organizado no Rio. “Extrema é a condição à qual foi levada a população do Rio de Janeiro”, sintetizou, emocionada ao final do discurso e agradecendo ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), pela designação para relatar a matéria.
Laura Carneiro lê relatório e se emociona ao final de pouco mais de meia hora na tribuna
PT, PCdoB e Psol estiveram em obstrução durante toda a sessão plenária, lançando mão dos instrumentos regimentais para retardar a votação. Obstruindo-se os trabalhos, excluiu-se, para cálculo do número mínimo de deputados exigido para promover votações, os 57 nomes do PT, os 11 do PCdoB e os seis do Psol. Nesse sentido, um leque de requerimentos, questões de ordem, discursos, encaminhamentos de bancada e outros direitos das minorias foi posto em campo por horas, levando a sessão madrugada adentro.
A 20 minutos da 1h desta terça-feira (20), a maioria governista aprovou um requerimento de encerramento das discussões, abrindo caminho para a rejeição de outros dois requerimentos de adiamento de votação, um por duas e outro por apenas uma sessão plenária deliberativa. A barreira das duas horas da manhã já havia sido rompida quando o relatório sobre o decreto foi aprovado, depois de muita troca de ofensas, alguma gritaria e das já tradicionais vaias mútuas.
Prós e contras
Depois do discurso de Laura Carneiro, seguiu-se o rito regimental para a etapa de discussão, em que três deputados a favor da intervenção e três contra falaram por três minutos, cada um, da tribuna do plenário. De um lado, a oposição dizia que a medida tem intenção multifacetada e serve a interesses escusos do governo Temer, como a mudança do foco das denúncias de corrupção e o mascaramento da insuficiência de votos governistas para aprovar a reforma da Previdência; de outro, membros da base defendiam a pertinência do decreto, face ao descontrole da segurança pública do Rio, e acusavam oposicionistas de se posicionar ao lado da criminalidade e contra os anseios da população.
Aprovado em um plenário atipicamente cheio, decreto segue para votação no Senado
Favorável ao decreto, Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ) afirmou que essa é uma “noite histórica” e aproveitou para criticar o PT, afirmando que as razões da crise de segurança no Rio têm nomes e siglas partidárias. “Gostaria de dizer claramente ao povo do RJ para ficar atento ao que acontece aqui hoje. Crise no RJ tem nomes e siglas partidárias. MDB teve, ao longo das décadas, PT e PCdoB como sócios e responsáveis pela desgraça da segurança do Rio”, discursou o deputado. “Intervenção federal já, é o que o Rio de Janeiro precisa.”
Primeiro a encaminhar voto contra, o líder do Psol, Ivan Valente (SP), classificou o decreto como improviso do governo. “Esse decreto não tem justificativa. É um improviso total, é o campeão do improviso”. Citando casos de corrupção envolvendo Temer e muitos de seus aliados, o deputado também criticou fala do ministro da Defesa, Raul Jungmann, sobre mandados coletivos de busca e apreensão cogitados pelo governo, com a ameaça de que casas de trabalhadores poderão ser invadidas. “É desviar o foco da crise para a segurança pública”, declarou Ivan, advertindo para a sinalização de uma agenda de “Estado penal” em vez de um Estado de bem estar social.
Efeito eleições: plenário chegou a registrar quase 450 deputados, de um total de 510, em plena madrugada de segunda para terça-feira (três estão na cadeia)