| Congresso em Foco |
As palavras entres aspas foram ditas em “off” ao Congresso em Foco pela liderança de um dos maiores partidos do Congresso, ainda sob o calor da desistência.
“Aqui para nós, eu vi a decisão dele com alívio. Como presidente do Supremo, Joaquim Barbosa chegou a dizer, em tom de ameaça, que teria muito a revelar. Imagine eleito presidente da República…”, declarou a liderança, sob condição de anonimato, referindo-se ao episódio em que o então ministro do STF, filiado ao PSB desde 6 de abril, sugeriu saber de muitos “podres” da República.
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Essa liderança congressista lembrou à reportagem que Joaquim Barbosa deixou crescer por meses, tanto no PSB quando no próprio eleitorado, as expectativas sobre sua candidatura. Uma figura sem vínculo com a classe política tradicional – categoria extremamente rejeitada em nível nacional, com apontam todas as pesquisas de opinião –, mas que experimentou a atmosfera eleitoral sem sequer ter se dedicado à tarefa de construir pontes, em âmbito partidário, para viabilizar seu grupo político na corrida presidencial.
“Ele não tem equilíbrio [para a Presidência da República], não quer conversa com político. Graças a Deus desistiu da eleição”, arrematou a fonte, com a experiência de líder de uma das mais influentes bancadas do Congresso.
Sem ter declarado alívio, o líder da Minoria do Senado, Humberto Costa (PT-PE), disse ao site que Joaquim Barbosa acerta ao deixar o páreo, uma vez que não seria talhado para a lida político-eleitoral. “Era uma coisa esperada. Apesar de que ser uma pessoa que se tornou uma celebridade, que tem uma respeitabilidade na sociedade, é alguém completamente fora da política, sem qualquer experiência administrativa. Sem qualquer perfil que permitisse administrar as contradições políticas que existem no Brasil. Acho que ele tomou uma decisão racional, inteligente”, arrematou o senador.
Em março, o comando petista recebeu pesquisas e análises de cenário que apontaram Joaquim Barbosa como o nome com mais potencial para frustrar as pretensões eleitorais do partido em 2018. Devido à sua trajetória de sacrifícios e à origem humilde, além do “perfil de centro-esquerda”, o ex-ministro figurou como o candidato com mais chances de atrair o eleitorado de um PT às voltas com a situação judicial do ex-presidente Lula, preso desde 7 de abril e enquadrado na Lei da Ficha Limpa. O resultado da análise foi adiantado pela jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo, em 23 de março.
Mas o PT de Lula, devido à prisão do ex-presidente, é um “caso à parte” atropelado por questões pragmáticas. Membro do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB), o professor Ricardo Caldas disse à reportagem que Joaquim Barbosa, ao sair do páreo, promove o retorno do cenário pré-eleitoral à situação anterior, em que Bolsonaro e a ex-ministra Marina Silva despontam na liderança sem Lula na contabilidade. A corrida eleitoral sequer começou de fato, lembra o acadêmico, mas a partir de agora institutos como Datafolha e Ibope terão que refazer trabalhos eventualmente em curso.
“Tem muita água ainda por rolar. Tem que ver quando eles vão fazer as pesquisas – e espero que façam a partir de hoje, porque pesquisas realizadas ontem, com Joaquim Barbosa, já não servem mais. Se as pesquisas incluíam Lula, meu cenário principal é uma contínua queda na intenção de voto no Lula, o que já se verificou na pesquisa Datafolha. Ele sai de um patamar de 35%, 36%, o que eu sempre achei um pouco inflacionado, para alguma coisa mais realista, em torno de 30%. Minha expectativa é que ele fique entre 26%, 27%, e se estabilize nessa faixa. Em relação aos demais, meu cenário principal nesse momento ainda é uma estabilização do Bolsonaro e da Marina. Não vejo nenhum grande crescimento de qualquer um dos dois”, avalia o professor emérito da UnB, para quem algumas fusões de candidaturas estarão a caminho nos próximos meses.
Sem aviso
A decisão pegou de surpresa a própria direção do PSB, que já articulava uma equipe de campanha para Joaquim, e revirou o xadrez pré-eleitoral a cinco meses do primeiro turno. A depender dos parlamentares e cientistas políticos ouvidos pela reportagem, a desistência acirrará ainda mais a disputa por votos em uma corrida presidencial marcada pela revolta popular contra corruptos dos mais diversos partidos. Nesse sentido, os pré-candidatos Bolsonaro e Ciro Gomes, nomes de “pavio curto” como Joaquim, podem lucrar com o vácuo eleitoral.
Identificado com o combate à corrupção principalmente por antipetistas, o relator do mensalão do PT no Supremo é lembrado pelos discursos duros contra desmandos na administração pública e pelos confrontos, por exemplo, com colegas de toga como Gilmar Mendes durante julgamentos de plenário. Com sua saída do pleito, deixa “órfãos” eleitores que nele viam uma voz contra a classe política desviada e, nesse sentido, pode favorecer candidatos de campos extremos, uma vez que o eleitorado votará “com raiva”. A opinião é do professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) Paulo Kramer, para quem a eleição de 2018, “infelizmente”, será marcada pelo voto de revolta com o “status quo“.
“A gente precisa entender que a cabeça do eleitor mediano, como gosta de dizer a Ciência Política, ao menos no caso do Brasil não se orienta por referenciais ideológicos clássicos, de direita ou esquerda, por exemplo. O eleitor, nesta eleição, está se orientando – ou se desorientando – pela raiva. Raiva dos políticos, da política, dos partidos, do Congresso etc. É o grande combustível do debate político-eleitoral deste ano”, observa Paulo Kramer, acrescentando que o fenômeno é compreensível.
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Para o professor da UnB, os “órfãos” da natimorta candidatura do PSB deixará sequelas. “Nunca antes na história do Brasil, como dizia alguém que está preso agora, o povo brasileiro teve tanto acesso a uma massa, a um bombardeio tão grande de informações sobre os malfeitos dos políticos e autoridades em geral. Isso gera essa raiva, e essa raiva gera uma demanda por messianismo”, acrescentou o cientista político, referindo-se à frase que Lula usava com frequência. Assim, avalia Paulo Kramer, candidatos como Bolsonaro e Ciro, conhecidos por seus discursos radicais nos respectivos campos ideológicos, podem ser beneficiados com a desistência de Joaquim Barbosa.
“A maior parte desse espólio [de votos] vai se dirigir, digamos assim, para candidatos mais extremados. Mas sempre sobrará alguma coisas para aquelas candidaturas mais mornas, tépidas, como a de Marina Silva, de um lado, e a de Geraldo Alckmin [PSDB], de outro”, arrematou o professor.
“Se há uma candidatura frágil, hoje, entre todas elas, de longe é a do Geraldo Alckmin. Ele conseguiu tirar o processo da Lava Jato para o Tribunal Superior Eleitoral, provisoriamente, mas o Ministério Público de São Paulo já pediu nova condenação dele por improbidade administrativa. E detalhe: ele está sem foro privilegiado. Então, pode ser levado preso a qualquer momento”, emenda o professor Ricardo Caldas, desconsiderando o caso do ex-presidente Lula, “juridicamente inviável”.
Coração
Depois de anunciada a desistência, Joaquim Barbosa disse que há semanas já recebia “avisos” de seu “coração” para deixar a disputa eleitoral. Em entrevista ao colunista Lauro Jardim, do jornal O Globo, o ex-ministro afirmou que vinha evitando ao máximo conversas que sinalizassem confirmação de candidatura. Na semana passada, relata o jornalista, o encontro com o presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira, foi um contraponto ao fato de que o ex-ministro evitou reuniões com economistas, líderes de movimentos sociais e parlamentares da bancada federal.
“Fiquei receoso que as próximas pesquisas mostrassem que eu estava subindo. Desistir mais tarde seria complicado em todos os sentidos. Acho que tomei a decisão no momento certo”, declarou Joaquim Barbosa, que apontou três receios em relação ao futuro do país: a possibilidade de eleição de Bolsonaro, que lidera em cenários sem Lula, a manutenção do presidente Michel Temer “no poder” e, dada a conjuntura nacional, o risco de “espaço para um golpe militar”.
A alegada decisão em boa hora é um “fato novo” providencial diante do “quadro eleitoral conturbado e de muitas incertezas”, segundo o diretor do Departamento de Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), Ricardo Ismael – ou mais uma “perturbação do processo eleitoral”, a exemplo dos rumores em torno do apresentador Luciano Huck (TV Globo), lembra o especialista. Professor de Ciência Política, Ricardo disse ao Congresso em Foco que, no curto prazo, Marina Silva é favorecida pela desistência em um primeiro momento, mas que depois o tucano Geraldo Alckmin, que não tem o apelo popular do ex-ministro, também lucra com o desembarque graças à estrutura do PSDB.
“De uma certa maneira, Joaquim Barbosa e Marina Silva têm conversado. Ele pode abrir espaço para alguma transferência de votos para Marina”, avalia o acadêmico, para quem as próximas pesquisas de intenção de voto vão dar mais fundamentação para a tese. “Eu tenho a impressão de que vai beneficiar a Marina. Agora, no médio prazo, se olharmos a eleição como um todo, e principalmente quando começar a prevalecer a questão dos palanques e dos programas de rádio e televisão, acho que tende a favorecer o Alckmin, que está bloqueado. O Joaquim Barbosa, de certa forma, impedia o crescimento do Geraldo Alckmin”, acrescentou o professor, reforçando a tese dos próprios políticos. “O Alckmin está respirando aliviado [com a saída de Joaquim].”
Embora não acredite que os candidatos “pavio curto” serão beneficiados com o novo quadro pré-eleitoral, Ricardo Ismael também aponta a falta de traquejo de Joaquim com o mundo político. “O problema de Joaquim Barbosa, também por ele não ser um político, estava querendo uma situação [partidária] mais confortável. Não vai ser de jeito algum. A campanha vai ter muita pancadaria, vai-se investigar tudo da vida dele. Talvez ele não quisesse isso”, ponderou o acadêmico. “Ele teria que lidar com coisas às quais não está acostumado, com críticas, entrevistas coletivas, debates. Isso é algo meio complicado, pois não há como blindá-lo.”
Saiu sem ter entrado
Diante das várias especulações sobre o que será o pleito presidencial sem Joaquim, ao menos um consenso existe em torno do ex-ministro. Observadores da cena política são quase unânimes em afirmar que era grande o potencial de crescimento dele na preferência do eleitorado – um capital político que, segundo os congressistas ouvidos pela reportagem, agora é desperdiçado sem muita explicação.
“É uma saída de que nem nunca entrou”, resumiu à reportagem o senador Ronaldo Caiado (DEM-GO), que já disputou eleições presidenciais, em 1989. “Ele nunca teve sua presença, nem partidária, confirmada. Em hora alguma foi sequer lançado. Cogitou-se a possibilidade de seu nome como pré-candidato e ele mesmo já informou que não tem o menor interesse em participar da disputa.”
Humberto Costa também disse ter visto a decisão de Joaquim com naturalidade. Mas, para o senador, a desistência não tem qualquer implicação paras as pretensões do PT, que insiste na candidatura de Lula e tem recusado alianças com Ciro Gomes, por exemplo. “Não acho que [a saída] favoreça a nós. Na verdade, o perfil que Barbosa procuraria na campanha seria o de centro-direita. Acho que isso mostra, mais uma vez, a dificuldade de entendimento que as forças que apoiaram esse golpe tem, hoje, em encontrar candidatos que sejam viáveis e, ao mesmo tempo, confiáveis”, acrescentou Humberto, aproveitando para fazer referência ao impeachment da correligionária Dilma Rousseff.
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Tanto o petista quanto o democrata minimizam as possibilidades de radicalização da disputa. Para Caiado, é precoce a ideia de que as eleições tendem a se radicalizar. “Temos até o final de julho para construir entendimentos. Não acredito que o Brasil vá caminhar para uma segmentação, para a continuidade do enfrentamento, de ódio ou de esgarçamento. Acredito que haverá bom senso e equilíbrio. Chegando próximo ao período eleitoral, as candidaturas vão ter que ganhar consistência, do ponto de vista de propostas e debates”, vislumbrou o parlamentar goiano.
Líder do MDB no Senado, Simone Tebet (MS) disse lembrou ao Congresso em Foco que Joaquim Barbosa vinha se credenciando para o segundo turno com uma marca forte, mas que isso não significa o monopólio do rótulo de combate à corrupção. Para a emedebista, tudo ainda permanece muito indefinido e o próprio ex-ministro era uma incógnita.
“A saída dele fortalece, ao meu ver, o centro, porque ele não era candidato de uma ala radical à esquerda ou à direita. Cientista nenhum vai conseguir fazer esta conta, mas será que ele pode ter tirado um pouco dos votos do Bolsonaro? Pode ser que, em um primeiro momento, sim. Mas quem disse que o centro-direita ou o centro-esquerda não vai ter uma bandeira de combate à corrupção? Como ele ainda não se pronunciou – nós só temos a imagem dele contra o mensalão –, não conseguíamos identificá-lo não só ideologicamente, mas em relação às principais pautas para poder defini-lo”, explicou a senadora.
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